Sistemas agroflorestais no contexto do processo da transição agroecológica
Resumo
Os sistemas agroflorestais são experiências locais que podem validar os princípios e enriquecer a própria concepção teórica de agroecologia. O resgate destas práticas tradicionais baseada na agrobiodiversidade, aliado ao conhecimento cientifico estão sendo sistematizados para apoiar o processo de transição agroecológica. Foram implantados e avaliados quatro arranjos agroflorestais, em três condições de áreas de pastagens abandonadas, no Campo Experimental da Embrapa Amazônia Ocidental. Nestes sistemas foram manejadas culturas anuais, frutíferas, pastagens e espécies florestais. Os arranjos estudados, além de resgatarem uma prática tradicional da população amazônica, demonstraram ser produtivos, capazes de gerar renda, segurança alimentar e prestarem importantes serviços ambientais. ABSTRACT Agroforestry systems are experiences that can validate the principles and enrich the own theoretical conception of agroecology. The rescue of those traditional practices based on agrobiodiversity, allied to the scientific knowledge is being systematized to support the agroecological transition process. They were implanted and evaluated four agroforestry systems arrangements in three conditions of abandoned pastures areas, in the Research Station of Embrapa Western Amazon. In these systems were managed annual and fruiters cultures, pastures and forest species. The arrangements studied, besides rescuing a traditional practice of the Amazon population, demonstrated being productive, able of generate income, feed safety and provide important environmental services. Palavras – chave: Amazônia, agrofloresta, agroecologia Key-words: Amazon, agroforestry, agroecology INTRODUÇÃO Na Amazônia, práticas tradicionais baseada nos princípios de agriculturas de base ecológicas, que se perderam com a “Revolução Verde”, estão sendo resgatadas e sistematizadas para apoiar o processo de transição agroecológica. É o caso dos sistemas agroflorestais, das populações tradicionais da Amazônia, caracterizados pela alta diversidade de espécies nativas, semi-domesticadas e domesticadas e manejados em agroecossistemas com maiores níveis de sustentabilidade socioambiental. O resgate dos princípios ecológicos de tais sistemas, aliado ao conhecimento cientifico e tradicional das principais espécies agronômicas cultivadas na Amazônia, estão servindo de base para a sistematização de arranjos, práticas e manejos agroflorestais pela pesquisa institucional. Este trabalho começou com iniciativas individuais de pesquisadores, em contraposição ao paradigma da agricultura convencional, e ganhou importância com a evolução e estratégia do movimento em agroecologia que fizeram com que a Embrapa institucionalizasse o assunto, com o lançamento do Marco Referencial em Agroecologia (EMBRAPA, 2006). Segundo CAPORAL e COSTABEBER (2004) o processo de transição agroecológica é complexo, tanto no campo tecnológico como metodológico e organizacional. Construído com avanços e recuos, dentro e fora dos sistemas de produção. Passa pelo processo de redução e substituição de insumo, manejo sustentável dos recursos naturais e redesenho dos agroecossistemas (GLIESSMAN, 2000). Contudo, depende dos fatores sociais, econômicos e políticos para tornar-se realidade. Neste cenário, os sistemas agroflorestais são experiências locais que podem validar os princípios, enriquecer a própria concepção teórica de agroecologia e contribuir no processo de transição agroecológica. MATERIAL E MÉTODO Este trabalho foi baseado na análise dos relatórios internos dos projetos de pesquisa e desenvolvimento executados pela Embrapa Amazônia Ocidental, com destaque ao projeto pioneiro em sistemas agroflorestais, denominado de “Dinâmica do solo, da vegetação e efeitos ambientais sob sistemas agroflorestais em pastagens degradadas”, financiado pela Fundação Rockefeller, convênio Embrapa/Universidade Estadual de Carolina do Norte-NCSU (1991-1994). Em sua segunda fase este projeto foi nomeado de “Recuperação de pastagens abandonadas e/ou degradadas através de sistemas agroflorestais na Amazônia Ocidental”, com apoio financeiro do Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil – PPG7 (1995-1999) e atualmente está vinculado ao Projeto do MCT/CNPq/PPG7-fase2. Os ensaios foram desenvolvidos no Campo Experimental da Embrapa Amazônia Ocidental, situadas no km 54 da BR–174 (Manaus-Boa Vista). Foram implantados e avaliados quatro arranjos agroflorestais, em três condições de áreas de pastagens abandonadas e/ou degradadas, manejados com médio e baixo insumo, três repetições em parcelas de 60m x 50m. Até o terceiro ano, foram mantidas as culturas anuais (arroz - Oriza sativa, mandioca - Manihot esculenta milho - Zea mays e feijão - Vigna unguiculata). Num processo simultâneo e seqüencial foram implantadas as frutíferas (mamão - Carica papaya, maracujá - Passiflora edulis, banana - Musa paradisíaca, acerola - Malphigia glabra, araçá-boi - Eugenia stipitata, cupuaçu - Theobroma grandiflorum, açaí - Euterpe oleraceae, pupunha - Bactris gasipaes, guaraná - Paulinnia cupana, pimenta-do-reino - piper nigrum e jenipapo - Genipa américa), as espécies florestais (mogno - Swietenia macrophylla, teca - Tectona grandis, castanha - Bertollethia excelsa, capoeirão - Colubrina glandulosa, paricá - Schizolobium amazonicum, andiroba - Capara guiaenensis e pau-rosa – Aniba rosaeodora) e a espécies forrageiras (Desmodium ovalifollium, Brachiaria humidicola e Brachiaria brizantha). A Inga edulis e Gliricidia sepium foram plantadas para adubação verde. RESULTADO E DISCUSSÃO Os arranjos agroflorestais (agrosilvicultural e agrosilvipastoril) permitiram a produção até o terceiro ano de cultivos anuais. No primeiro ano obteve-se a colheita de mandioca (10 t/ha.), milho (2,0 t/ha.) e feijão (0,4 t/ha.). No segundo ano, colheita de mandioca (8,0 t/ha.), arroz (0,5 t/ha) e feijão (0,4 t/ha). No terceiro ano, somente a colheita de mandioca (5,0 t/ha.). A partir do segundo ano iniciou a produção do mamão e maracujá e no quarto ano a produção das demais fruteiras. A banana foi introduzida após a saída do mamão. O açaí após a retirada de palmito das pupunheiras. O pimenta-do-reino após a saída do maracujá e o guaraná foi introduzido com a saída da acerola. As fruteiras dos sistemas agrosilviculturais iniciaram a produção com 0,4 t/ha/ano e podem atingir mais de 12 t/ha/ano, após o sétimo ano de plantio, incluindo a colheita de castanha, pimenta-do-reino e guaraná. As pastagens consorciadas produziram de 7 a 10 t/ha/ano de forragem. No agroecossistema de pastagem (agrosilvipastoril) pode-se optar pela rotação de cultivo anual de culturas alimentares, ou, fazer a integração de lavoura pastagem, estes ensaios estão sendo programados para serem avaliados a partir de 2007. O paricá, acerola, jenipapo e teca não apresentaram bom desempenho nestes agroecossistemas. Aos 12 anos de idade, as espécies florestais apresentaram um bom desempenho, além de produzirem madeira e produtos não-madeireiros, exercem importante papel na estrutura (esqueleto) dos arranjos agroflorestais, na ciclagem de nutrientes, no acúmulo de matéria orgânica no solo e armazenamento/seqüestro de carbono. A castanheira atingiu 19,5 m de altura e 35,5 cm de DAP e iniciou a produção, aos sétimo ano de idade, demonstrando ser uma espécie adaptada às condições de baixa fertilidade do solo. O mogno apresentou altura média de 12,0 m e 23,5 cm de DAP, alcançando mais de 6,0 metros de altura, livre do ataque da broca do caule (Hypsipylla grandella). Estima-se que possa ser colhido aos 25 anos de idade (DAP > 45,0 cm). A colubrina alcançou mais de 22,0 cm de DAP e 16 m de altura. No processo de ciclagem da matéria orgânica e reposição de nutrientes, o ingá e a gliricídia, adicionaram cerca 7,5/t/ha/ano de biomassa, contribuindo substancialmente na qualidade e quantidade de nutrientes, bem como, na diminuição de adubação química. Não foi usado agrotóxico contra pragas e o raro aparecimento de vassoura-de-bruxa (Crinipellis perniciosa) no cupuaçuzeiro foi controlado com as podas de galhos. Do ponto vista de validação dos princípios da agroecologia, os arranjos estudados, além de resgatarem uma prática tradicional da população amazônica, demonstraram ser produtivos, capazes de gerar renda, segurança alimentar e prestarem importantes serviços ambientais para a região. Sua sustentabilidade depende de práticas que estimulem a ação da biota do solo, a ciclagem de nutrientes e o manejo da matéria orgânica. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CAPORAL, F. R.; COSTABEBER, J. A. Agroecologia: alguns conceitos e princípios. Brasília, DF: Ministério do Desenvolvimento Agrário, Secretaria da Agricultura Familiar/DATER/IICA, 2004. 10 p. EMBRAPA. Marco referencial em agroecologia. Brasília, DF: Embrapa Informação Tecnológica, 2006. 70 p. GLIESSMAN, S. R. Agroecologia: processos ecológicos em agricultura sustentável. Porto Alegre, RS, Editora da UFRGS, 2ª. Ed. 2000. 654 p.Downloads
Publicado
2007-09-28
Edição
Seção
Resumos do V CBA - Uso e Conservação de Recursos Naturais